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Artigo – Gripe fora de hora

Por David Uip

Quadros gripais costumam ter evolução benigna. Assim, basta o controle dos sintomas a base de analgésicos e antitérmicos, hidratação, boa alimentação e repouso, que a doença tende a desaparecer em poucos dias.

Mas em alguns casos a infecção pelo vírus Influenza pode trazer complicações, principalmente em pessoas que possuem baixa imunidade ou fazem parte dos grupos mais vulneráveis, como os idosos, crianças, grávidas e doentes crônicos.

Quando o vírus A H1N1 retornou ao mundo em forma de pandemia, em 2009, o susto foi grande. Não havia vacina à época. Somente em São Paulo foram registrados 9,7 mil casos e 641 mortes.

Passados sete anos, já se sabe que a gripe causada pelo H1N1 não é mais nem menos perigosa do que as causadas pelas cepas mais comuns em circulação pelo mundo. Os cuidados relativos à prevenção e ao tratamento são os mesmos.

Em 2016 a gripe surgiu fora de hora no Estado de São Paulo. Antes de o inverno chegar. Até o último dia 29 de março foram notificados pelos serviços de saúde, via rede sentinela, 465 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) confirmados para o vírus Influenza, com 82,5% de predominância para o tipo A H1N1, e 59 mortes.

O número de casos graves de gripe já supera os registrados durante todo o ano de 2015, quando o vírus A H3N2 foi predominante, respondendo por 55,6% do total. Mas o cenário não se assemelha, nesse momento, ao ano da pandemia.

Ao analisarmos os gráficos do Centro de Vigilância Epidemiológica, observamos que em novembro de 2015 se nota um aumento na frequência de casos de SRAG por H1N1 e, concomitantemente, há elevação do número de casos pelo vírus Influenza B, cenário que se manteve até a nona semana epidemiológica deste ano, quando, de fato, a circulação do H1N1 se mostrou prevalente.

Em 2015, a presença de uma ou mais comorbidade foi verificada em 60% dos óbitos por SRAG notificados no Estado. Neste ano o índice é parecido: 61,5%.

É precipitado dizer o que causou a circulação antecipada e não prevista dos casos de Influenza antes dos meses de junho, julho e agosto, como costuma ocorrer.

Os institutos Adolfo Lutz e Butantan, ligados à Secretaria de Estado da Saúde, estão investigando hipóteses, inclusive para verificar se houve alterações de sorotipo e genótipo do H1N1.

Evidentemente que não é possível esperar respostas para agir. Ao detectarmos uma circulação mais intensa do vírus no noroeste do Estado, iniciamos em 23 de março uma campanha extra de vacinação em 67 municípios da região de São José do Rio Preto, com doses de 2015.

Com o apoio do Ministério da Saúde, que enviou doses da campanha deste ano, o governo paulista antecipou a vacinação na capital e região metropolitana da Grande São Paulo, iniciada no último dia 4 de abril para 532 mil profissionais de saúde de hospitais públicos e particulares e que a partir de 11 de abril também será estendida aos idosos, gestantes e crianças entre seis meses e cinco anos incompletos, totalizando, nesta imunização antecipada, 3,5 milhões de paulistas.

Já a partir do dia 18, a imunização atenderá portadores de doenças crônicas e em tratamento com imunossupressores, puérperas (até 45 dias após o parto), e população indígena residente na capital e região metropolitana de São Paulo.

Para as demais cidades do Estado a campanha de vacinação contra a gripe deve seguir o calendário do Ministério da Saúde, com início previsto para o dia 30 de abril. As vacinas, trivalentes, são produzidas pelo Instituto Butantan e protegem contra os três tipos de Influenza          que circularam no último inverno do hemisfério norte (A/Califórnia/ H1N1, A/Hong Kong H3N2 e B/Brisbaine). Importante ressaltar que a vacina, além de prevenir a gripe, ajuda a evitar complicações decorrentes da infecção por esses vírus, a exemplo de pneumonias, otites e sinusites.

São Paulo está enfrentando sua onda de gripe fora de hora com a seriedade e a serenidade que o momento exige. Há motivo para alerta entre as autoridades de saúde, mas nenhum para pânico entre a população. Vida normal.

David Uip, 63, médico infectologista, é secretário de Estado da Saúde de São Paulo